"NÃO SEI POR QUE MULHER GOSTA TANTO DE FARDA"

O secretário de Defesa Social do Estado, Wilson Damázio, parecia alarmado: na entrevista concedida no dia 22 de novembro, uma manhã de sexta-feira, me recebeu acompanhado pelo corregedor-adjunto Paulo Fernando Barbosa, pelo ouvidor da SDS, Thomas Edison Xavier Leite de Oliveira, e, finalmente, pela Gerente do Centro Integrado de Comunicação, Ana Paula Alvares Cysneiros. Estava, em parte, a par do assunto que seria tratado: o abuso sexual de policiais sobre jovens que vinham sendo acompanhadas há semanas, entre elas, duas menores. Para a sua assessoria, informei que se tratavam de abordagens criminosas de policiais do Grupo de Ações Táticas Itinerantes (Gati), da Rondas Ostensivas com Apoio de Motocicleta (Rocam) e da Patrulha do Bairro. Foi justamente a menção do mais “novo” projeto de segurança do governo estadual relançado ano passado (a primeira experiência aconteceu nos anos 80, gestão de Roberto Magalhães) que causou assombro desde o início. Faz sentido: a Patrulha do Bairro é a menina-dos-olhos da SDS e, por tabela, do governo Eduardo Campos. De acordo com dados da pasta, o projeto reduziu em 21% os Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLI) no segundo semestre de 2012 (na capital). Em Pernambuco, no primeiro semestre de 2013, foram menos 7% de homicídios. A meta do programa Pacto pela Vida era de 12%, mas os números são bem-vindos.
Assim, enquanto a Rocam e o Gati (campeão de registros na Corregedoria) já são velhos conhecidos da SDS quando os tópicos são denúncias e reclamações, a Patrulha até então figurava como estrela brilhante e inquestionável. No entanto, como foi dito no início desta série de reportagens que termina hoje, foram vários os relatos, de diferentes pessoas, de práticas abusivas da Patrulha localizadas na Rua da Mangabeira/Alto José do Pinho(também na Tamarineira). José, o homem que apanhou sete vezes em sua própria rua, sempre chegava perto quando eu ia a mais um dos encontros com Carol, Patrícia e Stephanie. Na última vez que nos falamos (29/11), dois dias depois de ser agredido novamente, ele disse: “A raiva tá guardada em mim. Eu não desconto em ninguém. Mas na próxima tapa que esses Robocop me derem, eu dou outra. Eu morro com dignidade e respeito. Vou ficar nesse lixo aí. Mas como indigente não”, falou, apontando para o grande depósito de plástico, comida, móveis quebrados e dejetos diariamente colocados no fim da sua rua. O lixo que rodeia tudo. O lixo do canal, o lixo que Carol joga na rua, o lixo que todo um bairro joga sobre a casa sem banheiro da jovem grávida.
Não relatei a história durante a entrevista realizada no gabinete do secretário, que durou cerca de 1h30 e foi bastante amigável. No entanto, por duas vezes, ele sugeriu que eu poderia estar inventando as denúncias. Segundo Damázio, a veracidade das minhas palavras seria melhor considerada caso eu informasse os locais onde os policiais estavam cometendo os delitos, pois, a partir daí, a SDS poderia abrir um procedimento. Traduzindo: eu deveria informar previamente ao chefe de segurança do governo estadual o cerne da reportagem que seria publicada apenas semanas depois. Educadamente, preferi não dizer nada. Não era o meu papel. Acredito que, desde domingo (15), quando a série começou a ser publicada, o delegado (com mais de 30 anos de carreira e cumprindo seu segundo mandato no governo Eduardo Campos) tenha passado a acreditar na realidade das meninas que circulam pelo Matagal informaram. Pessoalmente, não duvidei em nenhum momento do tipo de coisa que acontecia ali. Seria um interessante caso de criação ficcional coletiva, já que o lamentável comportamento da polícia foi relatado por pessoas das mais variadas idades e trajetórias. A conversa foi gravada em dois arquivos, um de seis minutos, outro de 51. Uma parte importante não foi registrada – o telefone tocou e interrompeu a captação, só retomada 30 minutos depois. Assim, nenhuma palavra dita durante o tempo em que o gravador não funcionou foi escrita aqui. Está publicado apenas aquilo o que se pode provar.
JC – Estou há cerca de dois meses ouvindo relatos a respeito da questão da exploração sexual, a matéria tem relação com o livro Casa-grande & senzala. Estamos fazendo um paralelo, mostrando que o sofrimento de meninas e mulheres naquele momento não se extinguiu nos dias de hoje. Entre as falas, algumas feitas por menores, há relatos sobre a atuação da Rocam, do Gati, da Patrulha do Bairro. Eles chegam ao local, dizem as entrevistadas, como se fossem fazer uma abordagem, mas, na verdade, os policiais pedem para ver os seios das meninas, há relatos de sexo oral. Falei com a corregedoria para ver se existem registros de casos assim e informaram que não.
JC – Isso foi na viatura?
JC – A patrulha está muito próxima da população. Nos bairros que têm maior índice de criminalidade, há algum tipo de preparação especial ou ela é homogênea para todas?
JC – Há mais de um ano que o Departamento de Polícia da Criança e do Adolescente (DPCA), especializada em crimes contra menores, não realiza rondas. Elas foram substituídas pela Patrulha do Bairro?
JC – Só para entender melhor: o senhor falou na Operação Sossego, que inclui desde ação para coibir som alto até abordagem de menores. Mas são coisas muito díspares, totalmente diferentes.
JC – E quando o Gati ou a Patrulha apreendem um maior explorando sexualmente uma menor, qual o procedimento?
JC – E há uma vulnerabilidade maior das meninas por conta do crack, da própria dependência do crack.
JC – E como é a desintoxicação dessas meninas?
JC – Que atualmente a igreja vem em grande parte realizando...
JC – Onde são os centros de recuperação do Estado?
JC – Isso me recorda o escândalo da Ronda do Quarteirão, no Ceará (programa semelhante ao Patrulha do Bairro), quando as câmeras dos próprios veículos filmaram os policiais fazendo sexo com mulheres dentro dos carros.
JC – Mas o carro é público, eles estão a trabalho, acho que não haveria essa questão.

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