Dinheiro de Lava Jato servirá para reformar colégios, mas mestres questionam escolhidos

Quase R$ 18 milhões, recuperados através da Operação Lava Jato, serão usados para reformar escolas da rede estadual de ensino do Rio de Janeiro. Foi o que autorizou, ontem, a Justiça Federal. Apesar de muito comemorada por educadores, a notícia está gerando polêmica. Isso porque, segundo contam os mestres, uma lista de 11 unidades contempladas com melhorias, já anunciada no dia 27 de fevereiro, foi definida pelo Ministério Público Federal (MPF-RJ) e pelo Ministério Público Estadual, e não pela Secretaria de Estado de Educação (Seeduc). A listagem consta na página do órgão na internet, em notícia veiculada sobre o termo de cooperação técnica assinado para a liberação de recursos.
O MPF, por sua vez, alega que aguarda elaboração, pela Seeduc, de listagem indicando quais as escolas beneficiadas com obras estruturais, assim como quais as intervenções devem ser realizadas, a previsão de custo e a quantidade de alunos beneficiados.
Uma das coordenadoras do Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação do Rio de Janeiro (Sepe-RJ), Beatriz Lugão aponta diversos outros colégios, fora da lista já divulgada, que enfrentam sérios problemas de infraestrutura. Os principais problemas, segundo ela, são infiltrações, risco de incêndio decorrente de ausência de manutenção elétrica e telhados destruídos.
“Temos uma escola em São Gonçalo, chamada Coronel João Tarcisio Bueno, que está sem telhado há dois anos. O colégio foi todo interditado, e os alunos foram transferidos para uma unidade vizinha. E o que será feito? Até agora, tudo que temos é um orçamento, no valor de R$ 3 milhões, e os alunos prejudicados”, cobra a educadora, referindo-se a uma escola que está fora da listagem do MPF.
De acordo com o procurador Sérgio Pinel, os principais problemas da rede estadual foram investigados por meio do programa Ministério Público Pela Educação (MPEduc), em que membros dos ministérios visitaram as unidades públicas e entrevistaram servidores. O diagnóstico revelou que a deficiência da estrutura física é um desafio que se apresenta em 64% das 1.221 unidades escolares.
Para Pinel, a decisão judicial de empregar o dinheiro desviado com a corrupção para reerguer unidades escolares é histórica e deverá ser copiada por outros estados brasileiros.
“O projeto executivo das reformas está sendo trabalhado. O prazo para que a Secretaria estadual de Educação apresente os projetos foi repactuado para até 40 dias. Estamos em fase de elaboração dos projetos de reformas”, afirmou.
Também integrante do Sepe, Marta Moraes cobrou maior investimento em manutenção por parte do governo estadual.
“Temos escolas onde os alunos convivem com chuva dentro de sala de aula. A maioria não tem nenhum tipo de manutenção. Não temos nem porteiro. Acho a iniciativa ótima, mas precisamos de mais. Muitas escolas estão em péssimas condições de conservação. E nós, professores, convivemos com esses problemas diariamente”, detona.
Presidente da Comissão de Educação da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), o deputado Comte Bittencourt (PPS) discorda do fato de a listagem de escolas beneficiadas com a cifra recuperada com a corrupção não seja determinada pela própria pasta correspondente.
“Há uns cinco anos, a Emop (Empresa de Obras Públicas) era responsável por vistoriar as unidades e identificar problemas. Isso, infelizmente, acabou. O que temos agora é uma seleção, feita pelo Ministério Público e não pela própria Secretaria estadual de Educação, de escolas que serão beneficiadas com reforma”, critica ele, que aponta a diminuição do investimento na rede estadual como principal entrave: “São inúmeros problemas hidráulicos, banheiros que não têm sequer vaso sanitário”.
Procurada por meio de sua assessoria de imprensa, a Secretaria de Estado de Educação não informou se está elaborando a listagem com as escolas contempladas com a cifra resgatada da corrupção, como informou o MPF.
Uma das escolas que consta na listagem das que seriam beneficiadas com reformas, o Colégio Estadual Pedro Álvares Cabral, na Rua República do Peru, em Copacabana, sofre com infiltrações que inviabilizaram o uso de sua sala de informática.
Já o Colégio Estadual Luiz Carlos da Vila, no Jacaré, Zona Norte da cidade, fora da lista, é apontado pela Comissão de Educação da Alerj como um dos que tem pior conservação de toda a rede. Imagens feitas durante uma visita à unidade mostram o forro do teto de salas de aula destruído, assim como rachaduras nas paredes, ventiladores de teto destruídos, maçanetas arrancadas e uma piscina abandonada que nunca pôde ser usada pelos alunos durante as aulas de Educação Física.
A situação de piscinas abandonadas por falta de manutenção se repete também na cidade de São Gonçalo, como apontou a professora Beatriz Lugão.
Alunos do Colégio Estadual Pedro Álvares Cabral, em Copacabana, não usam mais a sala de informática por conta de infiltrações
“Temos cinco Cieps (Centros Integrados de Educação Pública), em São Gonçalo, com piscinas construídas para aulas de Educação Física, mas nenhuma delas funciona. Isso afeta a qualidade do ensino como um todo. Houve investimento do poder público para construção, mas não existe manutenção. Quem perde com isso são os nossos alunos, que não estudam em ambiente minimamente confortável e seguro”, diz.
Na lista de unidades que serão contempladas com reformas há unidades nos bairros de Copacabana, Santa Teresa, Engenho de Dentro, Oswaldo Cruz, Cascadura, Acari, além de colégios nas cidades de São Gonçalo, Niterói, Barra Mansa e duas unidades em Angra dos Reis.

Comentários